Confesso que pequei. Claro, como todo momento de falha do caráter humano, estava frágil.
Problemas com a autoestima, cansada, vida corrida e sem tempo para pensar em mim.
Quando surgiu a oportunidade, fiquei receosa e insegura. Liguei para uma amiga. Ela me tranquilizou, disse que seria rápido e que me faria muito bem. Encorajou-me — com ela havia ajudado inclusive no relacionamento em casa.
O primeiro passo era marcar. Não queria que ninguém soubesse. Retirei-me estrategicamente para um canto mais calmo do trabalho e, quase sussurrando ao telefone, liguei para marcar.
— Espaço Mulheres Fúteis, bom dia? — disse a voz do outro lado da ligação (mudei o nome do espaço para proteger inocentes; ou culpados).
— Oi. Eu gostaria de marcar um jet bronze — falei quase cochichando.
— “Jet bronze”?! — A mulher gritou do outro lado. Por que quando pessoas estão com dificuldade em ouvir aumentam o tom de voz?
— Isso! — respondi já suando e quase me arrependendo.
Logo que expliquei a situação veio toda a etiqueta do procedimento. Se quisesse “lacrar” no bronze precisaria fazer o banho dourado um dia antes do evento. Só que a festa era no dia seguinte, um sábado. Além disso, a pele precisaria ser preparada com uma esfoliação corporal (tive que fazer consulta no Google e concluí que bastava dar aquela boa esfregada com a esponja pelo corpo). Depois do jet, para manter o bronze, era necessário 8h sem banho. Ou seja, correria, porque o assunto deveria ser resolvido naquele mesmo dia.
— Ah! E é importante vir com uma roupa bem folgada para não marcar porque o produto continua fazendo efeito algumas horas após a aplicação — completou a mocinha, já percebendo o grau da minha inexperiência. Imaginei-me na hora com a tatuagem de uma regata colada à pele.
Bem, como qualquer atitude às escondidas, precisei fazer várias manobras. Tive que correr em casa, tomar um banho daqueles, e correndo — quase me rasguei na esfregação!
O ideal seria ter cúmplices para aqueles 20 minutinhos off. Não sei por que me deu isso na telha. Não há cúmplices melhores do que as filhas, certo? Peguei as duas na escola. Logo fui explicando a situação.
— Vocês vão comigo, mas não podem contar nada para ninguém, ok? É coisa de mulher.
As duas, que não estavam acostumadas com a mãe tendo uma atitude dessas, ficaram me olhando com caras muito desconfiadas.
Chegamos e fomos conduzidas até o equipamento. Nesse momento eu já estava achando graça de toda a situação.
Antes do espetáculo, o ensaio. A esteticista me mostrando e eu repetindo as poses que eu precisaria fazer para garantir um bronze parelho, arrancaram gargalhadas minhas e das gurias. É impossível descrever, mas eu imagino que uma dança indiana possa conter alguns dos movimentos que precisei reproduzir.
“Hora de entrar na máquina!” Eu só ouvia os comandos que a moça gritava do lado de fora. Me senti passando por um lava a jato: “fecha os olhos!”; “agora joelho direito dobrado!”; “mão direita aberta pra frente!”; “braço esquerdo esticado e para trás!”; “isso, muito bem!”. Palavras de incentivo são sempre muito boas, principalmente quando você está se sentindo uma imbecil. “Pronto, outro lado!”; “inspira e tranca a respiração!”; “ótimo!”; “agora vira pra frente!”;.”pro outro lado!”; “deu!”.
Saí e dei de cara com o espelho. Eu estava pintada. Ainda dava pra ver os pontinhos de tinta que não haviam penetrado e se espalhado direito. Coloquei o vestido soltinho com todo o cuidado. Agora que tinha feito, tinha que preservar o resultado. As meninas balançavam a cabeça de um lado pro outro, bem no estilo mãe-que-mico.
Saímos para comer um pastel. Nenhum comentário do marido. Ótimo, pensei, deve estar natural. Se eu estivesse com uma cara de cenoura ele certamente teria indagado. No dia seguinte o resultado ficou ainda melhor. Almoço na sogra e alguém reparou:
— Stela, tu parece mais bronzeada.
— Eu? Não. Impressão tua — morrendo de vergonha de reconhecer a minha atitude mulherzinha.
Não sei o por quê, mas tenho dificuldades em usufruir desses recursos. Claro que gosto de me sentir bonita, mudar o visual. Sou suficientemente vaidosa. Mas sempre fui resistente aos artificialismos.
A festa estava ótima, a luz lusco-fusco não deixou ninguém perceber o resultado do bronze. Mas eu estava curtindo. Aquela sensação de algo que só tu percebe, mas que preserva a autoconfiança.
Se tem mais alguma coisa que eu faça às escondidas? Sim, já experimentei botox. Mas isso eu conto outro dia.
Adorei!!!!
Querida me deliciando com teus textos!!! É maravilhoso nos permitirmos mudar de opinião, voltar, rir de nós mesmas!! ❤ Me dá o telefone do Espaço fúteis, eu quero!!!!! hahaha